29.5.14

Olá, o meu nome é Francisco.

Saio do trabalho e é apenas mais um dia no calendário. Troco mensagens com 2 ou 3 potenciais companhias, assusto-me com as horas que já são e maldigo esta vida feita para pagar contas.
Sinto um vazio de merda e saudades de uma vida que parece que terminou há anos. Tenho saudades de voltar a uma refeição quente, a um "como correu o teu dia?", do beijo de boa noite ao miúdo, que já dorme. Tenho saudades até de ter alguém com quem discutir, porque não lavei a loiça e porque o estore está estragado há mais de 3 meses.
 
O emprego é a merda do costume, saio sempre já de noite, para regressar a uma casa vazia, abrir a porta do frigorífico e raptar um bocado de queijo para meter num pão e enganar o estômago.
Mando mais uma ou duas mensagens a tentar a minha sorte. Não me apetece estar sozinho.
Dois ou três beep's depois, percebo que perdi a paciência para tretas de joguinhos verbais.
Estou sozinho e é uma merda. Vejo umas miúdas giras a lamber-se, a fingir que se querem muito, devem ser de Leste e engenheiras.
 
Sonhei com todos estes dias por preencher, por colmatar o aborrecimento, por viver e levar com adrenalina na cara. Farto que estava de conhecer um corpo sempre igual, sem lingerie ou lubrificantes de sabor, que salvassem a mecânica acostumada. Sonhei com as noitadas com os amigos, com corpos nus a bambolear-se em varões, com shots e noites enevoadas.  Sonhei com conquistas, desejos renovados, um corpo mais tonificado e um aspecto de homem maduro e clean, que elas tanto parecem gostar.
 
E aqui estou eu, a chegar a casa, apenas para ler um recado da empregada, a avisar que não vem na próxima 3ª porque vai com a filha ao médico. A trabalhar mais horas, numa desculpa de não ir cair no silêncio das divisões. Vejo o meu filho ao fim-de-semana, levo-o ao cinema e ao Mac. Vejo a Sofia, que está mais arranjada, mais sorridente, mais mulher.
 
E talvez, só talvez, a mudança que tanto quis estivesse em mim. Talvez, só talvez, a companhia que me enfadava era só eu. Talvez, só talvez, precise de parar de sentir pena de mim mesmo.