16.12.12

We all pass them by.

Estamos no Natal e por aí multiplicam-se as campanhas de solidariedade. 
Pelas pessoas, pelos animais, pelas crianças, pelos sem-abrigo, por todos aqueles que nos parecem tão distantes, mas que poderíamos ser nós.
Apetece-me fugir de todos os promotores de solidariedade que me abordam, que me pressionam, que quase estão em cima de mim, fazendo-me sentir culpada se não contribuir para uma causa qualquer.
O que vou relatar tem a ver com a dura realidade das pessoas comuns e do quanto necessitam, não só no Natal, mas todos os dias do ano. Não só em relação às Associações, como aos indivíduos.
Porque o mundo pode "acabar" para muitos dia 21, mas até lá há quem possa deixar-nos por não ter como viver.

Vinha das compras semanais do costume e, já a chegar a casa, cheia de sacos de compras, vi uma senhora velhinha. Devia ter os seus quase 70 anos. Cruzamos olhares. Tinha um ar afável, simultaneamente triste. Disse-lhe bom dia e respondeu-me "pode dar-me algo para comer?".
Era uma senhora normalíssima. Provavelmente mãe de alguém, avó de alguém. Podia viver por ali, ou nem por isso. Podia estar perdida, ou ter-se perdido pelos caminhos da vida e da crise que afecta todos nós.
Dei-lhe um dos sacos para a mão e agradeceu-me. 

Se, naquele momento, todas as pessoas do bairro me pedissem ajuda, eu não teria como as ajudar, mesmo que quisesse.
Mas foi aquela pessoa, naquele dia. Assusta-me pensar naqueles que não estão no limiar da pobreza, mas que precisam de tanto para uma vida digna. Aqueles que não são um rosto que vemos na rua. A quem colocamos uma cara quando pensamos em quem passa fome, frio ou solidão.
Assusta pensar que, se calhar, tiveram apenas um azar, a falta de um apoio no momento certo, de uma educação que lhes permitisse sobreviver mais astutamente nos dias que correm.
Foi uma lição de humildade. E nós, tantas vezes preocupados com tablets, prendas, perfumes, consolas e todas as coisas que queremos para preencher a nossa vida, esquecemo-nos que o nosso maior presente ainda é podermos ter uma vida condigna.

16 comentários:

  1. As pessoas esquecem-se do que realmente importa por pequenas coisas materiais...é assim que vivemos e é assim que vai continuar a ser, só nesta época é que nos lembramos dos outros o que é triste!

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  2. Acho que cada vez mais, e tendo em conta a realidade que vivemos, temos de ser mais uns para os outros.

    Claro que é irrealista pensar que podemos ajudar tudo e todos. Mesmo que quiséssemos, tal seria impossível. E além do mais, temos que preservar uma pequena réstia de egoísmo para os nossos, que estão sempre em primeiro lugar. Porém, isso não significa que não ajudemos os outros quando podemos e principalmente quando nos deparamos com situações como a que te aconteceu. Felizmente, não é por um saco das compras, nem por dois ou três, que vamos passar dificuldades. Não custa nada ajudar quem realmente precisa, no momento certo e na hora certa.

    Não é preciso sermos clones da Madre Teresa de Calcutá, mas tenho a sensação que cada vez mais temos a obrigação de ajudar os outros.

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  3. Não está fácil Cueca.
    A vida continua a correr como sempre correu, nem sempre um tipo consegue ver o que está mais perto e tudo serve de desculpa para não ver.
    Bom, este fim de semana já foi a contribuição portuguesa contra o cancro. Vamos andando...

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  4. O Natal este ano, por cá, vai ser muito bom. Quanto mais não seja, ainda conseguimos arranjar algumas prendas uns para os outros. Tudo coisas úteis (OK, o meu pai vai receber uma garrafa de licor, mas... é consumível!). Estamos juntos. Temos saúde. Não nos falta nada do que é realmente importante. Somos muito mais afortunados do que podemos imaginar.

    É nesta altura do ano que nos lembramos mais do próximo, mas se há algo que tenho vindo a aprender é que essa lembrança, essa consciência, tem que ser constante. Hoje são eles, amanhã sou eu. E isto é (assustadoramente) muito mais real do que podemos pensar.

    Tenho dificuldade em acrescentar o que quer que seja ao teu texto e ao teu gesto. Estás de parabéns pelos dois. :)

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  5. Sempre houve pobreza e sempre haverá infelizmente. Às vezes estamos tão preocupados com os valores materiais que nos esquecemos que há pessoas que não vivem com o que nós chamamos de básico.

    Ah e acho ridículo certas associações de solidariedade lembrarem-se apenas dos pobres no Natal e de quererem ajudá-los apenas na época natalícia, quando eles na verdade passam dificuldades 365 dias por ano!

    No que ajudo é na contribuição para o Banco Alimentar...

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  6. Normalmente eu estou do lado de cá: o lado de pedir. Faço voluntariado e hoje por acaso participei na missão sorriso. É preciso estômago para ouvir certos comentários como: "vou contribuir para esses cabrões do governo mas dou à mesma", "mas isto é para África? Se for não dou!", "Mas isto é todos os fim de semanas? Que chatice!"... Bem, eu não tenho culpa e faço a minha parte. Nem todos podem dar e contra isso nada. Mas há exemplos onde devíamos colocar os olhos como uma senhora que disse-me que não dava porque era ajudada pela Cruz Vermelha pois passava fome, essa mesma senhora é voluntária da Cruz Vermelha. Não cruzou os braços e decidiu ajudar pessoas que passam pelo mesmo que ela. Infelizmente nem todos tem o espírito de ajuda ao próxima e ajudar o próximo não é só no Natal. Ajudar o próximo é durante todo o ano. Podiam existir mais pessoas com a tua atitude Rosa Cueca :)

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  7. Arrgg.. O Natal perdeu o seu sentido... O teu relato não podia estar mais correcto, ajudar espontâneamente, alguém que está ali ao nosso alcance, que não percisa de ajuda só no natal..

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  8. Uma agonia. Não consigo mesmo lidar com nítidos olhares de fome.

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  9. Custa compreender a dimensão da fome dissimulada em Portugal.E o abandono dos idosos pela família...

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  10. Tanto eu como a minha irmã sempre fomos educados no sentido de ajudar o próximo. Se calhar devido a isso, sempre gostei muito mais de dar do que receber. Quando estudava no secundário, estudavam comigo várias crianças da Aldeia SOS, que é uma instituição que acolhe crianças que foram retiradas ou abandonadas pelos pais. Normalmente estas crianças eram muito problemáticas, mas como tudo havia alguns que eram crianças super normais e aplicados na escola e a única coisa que os diferenciava de todos os outros é que passavam enormes dificuldades. Como sempre me fez imensa confusão alguns deles serem gozados pela maneira de vestir, falei com a minha mãe e comecei a entregar roupa e brinquedos que já não usava na instituição. Com o passar dos anos apeguei-me a muitas crianças que lá vivem e ainda hoje continuo a fazer voluntariado e ajudar naquilo que posso.
    Não nasci num berço de ouro, mas faz-me muita confusão quando ouço pessoas dizer que gostavam muito de ajudar e que só não ajudam porque não podem, eu também não tenho capacidade financeira para dar grandes contributos financeiros mas por exemplo dou explicações, ajudo a fazer os TPC dos miúdos, vou lá visitá-los,... Existem várias formas de ajudar os outros basta querer e ter força de vontade.

    Rosa, bonito gesto!

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  11. Se cada um de de nós se deixasse tocar assim de vez em quando por alguém, ajudaríamos muita gente.
    O teu texto já me deu que pensar.

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  12. Só de imaginar o que deve custar a alguém, pedir a um estranho na rua, algo para comer... Pode ser alguém que nunca precisou e precisa agora! Desesperante... E muito triste.

    Só discordo quando dizes uma velhinha de quase 70 anos! (A minha mãe tem 72 e não nada velhinha!!)

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  13. o karma volta sempre, de uma forma ou de outra, foi um bom gesto da tua parte rosa cueca

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  14. Gostei tanto, TANTO deste post...
    Nem tenho palavras!

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